23 dezembro 2009


prefiro fechar a mão com força
e deixar ensanguentar
do que abrir mão
da beleza que essa tem

de nada importa o sangue que escorre pelo braço
a dor dos espinhos perfurando a pele
o aperto incessante no peito
e o natural cansaço de viver

se meus olhos se sentem
tão bem
ao apreciar tamanha beleza
(e transmitem a todo o corpo)

06 dezembro 2009

Viver do novo


Inevitável lembrança
Inesgotável esperança
eterna vontade de reviver um tempo
que já passou

Mas não adianta ser o mesmo tempo
com as mesmas coisas, pessoas, momentos
reviver um tempo novo
de novo, assim, eu quero

21 novembro 2009

abrigo em mim um monstro
e ele sim é dual
é ele quem ama e odeia
eu sou totalmente imparcial

se tiver algo a reclamar
se dirija direto a ele
cansei de passar recados
me sinto culpado também

não me responsabilizo
se ele está solto
como vou prendê-lo
se ele é mais forte que eu?

tanto me alivia saber
que sou só eu mesmo
e o monstro a mim pertence
quem comanda agora?

17 novembro 2009

estou reservado pro futuro, embalado pra presente
serei desembrulhado num futuro comovente
tal qual me calo num presente confuso
sem saber ao certo se sou o presente ou o embrulho

um mar de dúvida sem dor
incertezas com requicitos de horror
livre do passado e do futuro
sou todo presente obscuro

16 novembro 2009

por dentro a carne toda
está dilacerada
o coração, os pulmões, o rim
principalmente o estômago
(além do fígado e do intestino)
se juntaram todos
como numa vitamina feita
num liquidificador


e toda a minha dor
fica liquidificada dentro
de mim
os orgãos todos se tornaram
um líquido bebível
que ninguém ousa experimentar


minha dor é liquida
e por assim ser
é livre pra fluir
em todo o meu corpo
em toda a minha existência
mesmo na minha própria ausência

15 novembro 2009

não quero comer nada
quero comer a mim mesmo
comer todas as minhas lembranças
e obrigar a memória a ajudar a digerir

vou digerir a mim mesmo
cada pedacinho de carne
que contém uma parte de um falso eu
e de um verdadeiro você
[de um falso amor e de um verdadeiro sentimento]

e vou digerindo tudo isso
muito mal digerido, é verdade
mas comendo a mim mesmo
vou conseguir esquecer você
uma enorme distância
é facilmente superada
sem motivo aparente
só por ser ela mesma, enorme

uma pequena distância
já é mais complicado
a ansiedade é inevitável
com tão tênue aproximação

mas quando se acredita haver
uma pequena distância
quando na verdade é enorme
é dolorosamente insuportável (ou insuportavelmente doloroso)

12 novembro 2009

não quero música
(na verdade eu não quero nada)
não quero ócio
nem diversão
nem marmelada
(na verdade eu não quero nada)
o marrom glacê
que outrora me causou vontade
hoje me parece trivialidade
quem dera eu soubesse o gosto
da batata doce nua e crua

não quero sentir tesão
não quero me meter em confusão
(na verdade eu não quero nada)
a marrom glacê
até me despertou certa vontade
mas hoje eu não quero nem ela
(na verdade eu não quero nada)

22 outubro 2009

O balanço do ônibus
me tranquiliza, com ele
eu alcanço o que
parado é impossível

O movimento linfático
pra lá e pra cá
um movimento estático
que me faz voar

19 outubro 2009

Agora eu já não sei
o seu olhar é tão profundo
que quer me dizer algo

Agora eu já não sei
o seu sorriso tem certa malícia
com que se quisese me devorar

Agora eu já não sei
se deixo você me tomar o pensamento
me tomar a mim mesmo

15 setembro 2009

[E agora eu descobri]

E agora eu descobri aonde é que a vida passa.
Ela não passa naqueles momentos bons que parecem ser mais rápidos do que qualquer outro.
Ela não passa nas horas que você fica contando quando está entediado.
A vida passa na espera.
Na espera do ônibus, do jantar, do telefonema.
Na espera de algo melhor, do mais belo, da felicidade.
Ela passa na espera do momento seguinte, e no momento seguinte ela passa na espera do momento seguinte, e no momento seguinte ela passa...

Pra nunca mais voltar.

09 setembro 2009

As vezes eu me pergunto
se tudo isso é mesmo normal.

As cores que só eu enxergo
são as cores de algo real?

Mas você não tem noção
do que existe e do que é só ilusão.

As vezes eu me pergunto
se essa vida é mesmo real.

As coisas que eu faço todo dia
passam de algo banal?

06 setembro 2009

lá fora, a chuva caindo
aqui dentro, o vidro
embaçado
[eu vejo tudo melado]

em meu coração, um sentimento velado
nos meus sonhos, nada dá errado
[eu vejo tudo melado]

mas lá fora a chuva molha
os famintos e os desesperados
os pelados e os agasalhados
[eu vejo tudo melado]

04 setembro 2009